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Michel de Certeau
 Por.: Antonio Marcos de Almeida Ribeiro
UNEB/Campus XIII


A base de formação de Michel de Certeau (1925-1986) passa pelas Letras Clássicas, Teologia, Filosofia e História um tipo de orientação eclética voltada para um conhecimento de encaminhamento religioso. Torna-se padre em 1956 pela Companhia de Jesus. Sobre as suas pesquisas de cunho historiográfico elas estarão voltadas para textos clássicos de forma interdisciplinar em análise antropológica, psicanalítica, sociológica e linguística permeando seus estudos de forma erudita como um dos expoentes da historiografia do século XX. De uma forma a captar o momento histórico de uma forma mais ampla.

Seus estudos estarão voltados para religião e o misticismo dos séculos XVI e XVII o que também escreverá sobre historiografia com um enfoque a multiplicidade cultural, ou seja, para ele a pesquisa historiográfica deveria estar ligada a história cultural. No livro A escrita da história (2002) o autor teoriza sobre o historiador e a concepção de sua análise histórica. A instituição será uma influencia relevante ao historiando, onde desde a escolha do objeto e das fontes passa por regras acadêmicas que legitimará o resultado final.

Em se falando das características do trabalho do historiador a operação historiográfica possui a particularidade de estar falando de um domínio e de um lugar ao praticar a investigação. É dentro dessa operação que se articula uma teorização que organiza todos os procedimentos obedecendo a regras acadêmicas com suas próprias determinações. O cerne de seu pensamento é “Toda pesquisa historiográfica se articula com um lugar de produção sócio-econômico, político e cultural” (CERTEAU, 2002, p. 62). É em função desse lugar: a instituição, que se instaura a rede de interesses dentro de uma pesquisa.



Em um momento a academia legitimava a ‘verdade’. Mas desde os annales não se pensa assim dessa forma sobre a questão do historicismo. Esse modelo ultrapassado era um sistema de referencia que se infiltrava nos trabalhos de investigação num esforço teórico para conceber um resultado com circuito fechado, ou seja, revelar a ‘verdade’. Mas como métodos e modelos passam por flutuações epistemológicas, ante as pesquisas positivas a França olhava com desconfiança para essas abordagens e se propunha a um novo modelo institucionalmente legitimado pela academia. O que lhe daria outro sentido instrumental aos fatos constituídos, assim nascia a Escola dos Annales.

Essa intervenção deu resultados e se desenvolveu em trabalhos notáveis que sucumbiu os posicionamentos rankeanos. Instaurava um saber de um lugar, de uma instituição de linguagem científica onde “cada ‘disciplina’ mantém sua ambivalência de ser a lei de um grupo e a lei de uma pesquisa científica” (CERTEAU, 2002, p. 70). Resumidamente existe um saber histórico dentro de um lugar.  Entre o saber e o lugar se ajustam os enquadramentos das pesquisas. O lugar torna-se uma arena dentro de um jogo hierárquico, de interesses ideológicos e políticos nacionais. E o produto final é o livro de história (lê-se texto histórico) que se enuncia num conjunto de práticas do estudo particular que é reconhecida pelo “lugar” e pelo público que o recebe. Ele nos fala que “o estudo histórico está muito mais ligado ao complexo de uma fabricação específica e coletiva do que ao estatuto de efeito de uma filosofia pessoal ou à ressurgência de uma ‘realidade’ passada. É o produto de um lugar”. (CERTEAU, 2002, p.73).
Ainda segundo CERTEAU (2002) os métodos são comportamentos institucionais e as regras do meio a “textura dos procedimentos científicos” (p. 73). Que é organizado pela profissão, pela carreira. O que se detecta, na sua ótica, é que uma situação social pode mover um modo de trabalhar e com isso tendências de se escrever. Por isso existem os modismos tão apresentáveis de época em época. Como diz: “Uma mudança da sociedade permite ao historiador um afastamento com relação aquilo que se torna, globalmente um passado”. (CERTEAU, 2002, p. 75).
A ideia de Universidade colonizada pela sociedade tecnocrática e produtivista se entrega a outras demandas e o “não dito” ou a “neutralidade” afirmada fica como ditadas por influências externas. A função do lugar é permitir e proibir segundo o seu código, sistema que a elaborou. Em suma, para Certeau, fazer história é uma prática legitimada pela academia.  A articulação dessa prática é trabalhada de acordo o método no qual se transformará em ‘história’. O homem no tempo é um material de análise que obedece a regras de manipulação. Ele fala que “Em história, tudo começa com o gesto de separar, de reunir, de transformar em ‘documentos’ certos objetos distribuídos de outra maneira. Essa nova distribuição cultural é o primeiro trabalho” (CERTEAU, 2002, p. 81). Ações combinadas formam uma operação técnica numa combinação de grupos, lugares e práticas fazendo ‘falar’ um cabedal de documentos.
O ponto essencial é a transformação da abordagem nas pesquisas com renovadas metodologias que fornecem respostas novas a questões diferentes essa “é a condição de uma história nova” (p. 83). Esses novos procedimentos tende a ser diferente de como se praticava história no passado levando-nos a uma compreensão mais coerente. Esse extrato exemplifica bem isso:
Para retomar um vocabulário antigo, que não mais corresponde à sua nova trajetória, poder-se-ia dizer que ela não mais parte de “raridades” (restos do passado) para chegar a uma síntese (compreensão presente), mas que parte de uma formalização (um sistema presente) para dar lugar aos “restos” (indícios de limites e, portanto de um passado que é produto do trabalho). (CERTEAU, 2002, p. 86).
Dessa forma o autor deixa bem claro que a partir da nova história um processo de novas abordagens em suas palavras “faz um desvio”. Onde se pesquisava impérios, reis, guerras, deu lugar às “zonas silenciosas” da loucura, literatura popular, camponeses, proletários, prostitutas, migrações, etc. Uma experimentação mais crítica dos novos modelos, ou seja, “A estratégia da prática histórica implica um estatuto da história” (p. 90). A prática hoje pauta-se em decifrar as diferenciações que permitem uma exploração sistemática e não o narrar fatos como outrora.
Outro ponto que toca, sobre a escrita da história é que ela fica refém da prática e mais “a historiografia trabalha para encontrar um presente que é término de um percurso, mais ou menos longo, na trajetória cronológica (a história de um século, de um período ou de uma série de ciclos)”. (p. 97,98). A cronologia é uma referencia de todo relato e o discurso histórico “pretende dar um conteúdo verdadeiro (que vem da verificabilidade), mas sob a forma de uma narração” (p. 100). As citações e recortes temporais possuem o poder, um lugar de autoridade para produzir credibilidade.
Ele ainda compara a narrativa histórica a um passeio no museu: “A historiografia tem a mesma estrutura de quadros que se articulam com uma trajetória. Ela re-presenta mortos no decorrer de um itinerário narrativo” (p. 107). Para Certeau, que analisa os discursos e o ato narrativo isso é uma forma ritual de evocar “mortos” para que “os vivos existam” no desejo de constituir a relação com o outro. Mostra ainda como as produções se dão no âmbito da narrativa e do discurso. Utilizando do conhecimento em linguística Certeau nos remete a lugares “sócios” e “culturais” entre outras para unir as práticas cientificas em função de uma instituição.
A operação historiográfica Descreve as principais características do oficio de historiar fazendo um panorama de como a disciplina histórica se comportou ao longo do século XX. Percebe-se na leitura os saberes de sua formação em destaque a análise do discurso onde a “escrita” é analisada profundamente sob a ótica da linguística. Isso mostra a sua capacidade de argumentar passando por campos distintos. Um tipo de formação raramente encontrada.
Em tópicos a leitura passa por três etapas: o lugar, a prática e a escrita que em resumo são as formas da história pensadas por ele. Como se fosse blocos de discussão afunilando para uma abordagem mais profunda. Certeau conclui que a narrativa tem a capacidade de trazer os mortos ao mundo dos vivos transformando-os em matéria-prima para quem historia. Ele debate com elementos da Nova História com uma profunda reflexão sobre a produção dos fatos e coloca os historiadores metaforicamente numa posição de “coveiros” que dialogam com os mortos. 
REFERENCIA BIBLIOGRAFICA 
CERTEAU, Michel de. A operação historiográfica. In: A escrita da história. Editora Forense Universitária, 2002.

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